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Posts Tagged ‘Antropologia’

A partir de suas pesquisas em Antropologia da Ciência (Sciences Studies), considerando as distintas perspectivas de pesquisa sobre a Ciência nas Ciências Sociais, (História da Ciência – abordagem internalista e externalista; sociologia da ciência, etnografia da ciência, entre outras) Bruno Latour retira de seu próprio “objeto”, uma metodologia e toda a discussão sobre se a abordagem do’ator-rede’ se trata ou não de uma, para uma perspectiva que busque reunir em um mesmo tipo de análise, uma abordagem do fato científico enquanto algo, científico, social e linguístico, simultaneamente, a partir da ideia de híbridos, que ele constata sobre os fatos que observou.

Considerando a existência destes ‘híbridos’, que povoam uma modernidade tardia que seu livro “Jamais Fomos Modernos”, procura apresentar os paradoxos do projeto moderno (sua Constituição), no que diz respeito à duas operações por ele indicadas e que marcam a característica prima facie da modernidade em sua separação das coisas em duas realidades ontológicas diferentes, a saber: a natureza e a cultura. Estas operações seriam os processos de purificação – a separação dos objetos nestas realidades e a produção de redes – propriedade de juntá-los, conectando diferentes objetos que, a princípio, seriam de realidades ontológicas diferentes, e que tem como resultado a proliferação de híbridos.

Nesse sentido, diante desta proliferação, o “miracoloso ano de 1989”, apresenta-se como caudatário dos limites das críticas e o fim das utopias, pelo fato da inexistência de teorias capazes de reunirem um pensamento que trate estas coisas, que são tomadas de maneira separada. Ou seja, apenas problemas restritos à esfera científica, política ou da linguagem; campos que pautam as três narrativas criticas mais poderosas.

Tal separação permite pensar a simetria como uma propriedade que deve ser buscada pelo antropólogo ao investigar os processos de separação desses híbridos – humanos e não-humanos,  “nós” e “outros.” A modernidade então seria a crença nesta separação e sua produção constante, que de maneira ambígua aparece como desacreditada em decorrência da própria proliferação destes híbridos e que a ciência, a filha predileta deste projeto moderno, é capaz de produzir(los).

Algumas teses são importantes resultados da apresentação de tal panorama: (a) a explicação da hegemonia científica na modernidade por sua capacidade de mobilização de recursos e criação da necessidade de produzir “híbridos”, o que a torna poderosa em relação a outros coletivos. (b) A possibilidade de crítica do relativismo.

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Apresentação

 

João Pacheco de Oliveira é professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Museu Nacional, PPGAS) Tem experiência na área de Antropologia, com ênfase em Teoria Antropológica. Atuando principalmente nos seguintes temas: Indios Tikuna, Pesquisa Antropologica, Etnicidade, Etnologia Indigena, Amazonia e Identidade Nacional. 

http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?metodo=apresentar&id=K4788304Y9

 

 

Etnologia

 

 Interlocutores:        – políticas indigenistas (Estado), projeto Rondon.

                                 – representação estereotipada dos índios (sociedade)

                                 – teoria antropológica (etnólogos, etnologia clássica)

 

Objeto: etnias indígenas no nordeste brasileiro

 

Problemática: emergência de identidades, processos de etnogênese.

 

Teorias sobre: “sociedade”, “culturas”, “etnias” (relação para EVC) ou como questões de identidade para Pacheco de Oliveira.                                 

 

Teorias sobre a identidade: abordagem objetivista (Cohen) x subjetivista (F. Barth)

 

Métodos e Técnicas de abordagem:

Etno-história (antropologia histórica), etnografia, investigação sobre os aspectos políticos da identidade de grupos sociais.

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Clifford, James. 1988. “On ethnographic authority”. In: The predicament of culture- twentieth century ethnography, literature and art. New York: Harvard University Press,514ZKF3EKWL._SS500_-750995

James Clifford começa seu texto com frontispícios de livro de etnógrafos desde o Séc. XVIII até Malinowski no início do século XX para problematizar o lugar do etnógrafo nas descrições que fazem de outros povos. No primeiro caso sobre os ‘selvagens’ ameríndios e, no segundo, com Malinowski sobre os Trobriandeses do leste do pacífico retratando o Kula – ritual de troca central da vida social na melanésia.

Desta feita sobressai uma crítica, esta no sentido reflexivo, do lugar da etnografia moderna em comparação com as outras precedentes, pela qual na primeira a mediação com a experiência etnográfica se dá pelos livros, e na segunda, se destaca o ‘realismo’ e autoridade sobre o relato implícito, construídos a partir de fotos, como no caso do Kula trazendo à escrita etnográfica o que Clifford classifica como: O modo predominante da autoridade do moderno trabalho de campo assinalado por um “You are there… because I was there” (Clifford, 1983, p.22)

O autor no texto propõe uma não exaustiva analise da formação e da ‘quebra’ da autoridade etnográfica nos trabalhos que partem da observação participante, não esgotando todas as tradições dando ênfase apenas a escola francesa, inglesa e americana, de modo que fica os exemplos guiados por tradições anti-positivistas como a oferecida por Wilhelm Dilthey a partir da diferenciação de uma epistemologia de interpretação. Em detrimento ao movimento explicativo preconizado pelas descrições próximas do modelo sugerido pelas ciências naturais que o autor avisa não ser analisada.

O contexto dado para o ‘predicament’ é o de redistribuição do poder colonial ocorrido a partir da década de 50 e os ecos das teorias da cultura radicais dos anos 70 e 80. Em suma, a partir da ascensão de movimentos políticos, um processo de globalização, o discurso antropológico é mobilizado não apenas a partir de uma ideologia ocidental, mas passa a ter que lidar com diferentes autores no debate em um movimento apontado em literatura por Mikhail Bakhtin de ‘heteroglossia’. A ambigüidade de um discurso multivocal coloca para a etnografia o problema da representação do outro e da diversidade cultural, pois a diferença aparece como um efeito de um sincretismo inventado, afirma o autor.

Nas linhas seguintes, analisa-se o trabalho de Edward Said e a questão do orientalismo apontando como foi construído um saber do ocidente sobre o oriente e a crença na positividade deste a despeito de um fundo ‘real’ participativo e que expresse as diferenças do ponto de vista do próprio oriente para subsidiar a crítica que diz que: “These studies suggest that while ethnographic writing cannot entirely, escape the reductionist use of dichotomies and essences, it can at least struggle self-consciously to avoid portraying abstract, a historical ‘others’.” (Clifford, 1983, p.23). Portanto, tem-se a relação intima entre a produção de conhecimento cientifico e a legitimidade da empresa colonial com relação a estes povos configurada por uma relação especifica entre método cientifico e modos de dominação colonial que desconsideram as relações de dominação historicamente construídas.

Outro ponto a ser ressaltado pelo autor na produção das etnografias é a capacidade do método constituir-se com uma experiência e a dificuldade de tradução destas. E surge daí uma critica à crença na possibilidade de tradução ideal como o mito da etnografia moderna. No sentido de não considerar, as contingências, limitações que o próprio campo oferece.
Segundo o autor, os estilos de descrição cultural não estão reduzidos a disciplina antropologia e assumiu diversas formas historicamente modificadas. Mais uma vez ressalta que o entendimento da etnografia como ciência não deve ser desligado das implicações politica-epistemologicas debatidas sobre a representação e escrita sobre os ‘outros’.
A esta parte introdutória do tema o autor precisa a pergunta que se faz e a partir de onde irá procurar suas respostas. Se a etnografia produz interpretações culturais a partir de intensas experiências de pesquisa, como esta experiência é transformada em um texto de autoridade? Como precisamente o encontro das culturas atinge uma relação de poder circunscrita em uma versão adequada ou não de um ‘outro mundo’ produzida por um autor individual?

O autor sugere a hipótese que do começo ao fim o complexo de transformações se dá pela passagem da tradução da experiência na forma textual. Assim uma complexa experiência individual é anunciada por um autor, tal como o caso de Samoa de Margareth Mead, dos Nuer de Evans-Pritchard, We, the tikopia de Raymond Firth entre outros. Assim a investigação se pauta pela discussão da construção histórica do discurso de autoridade inscrito na prática da observação participante ao longo do Sec. XX.

Keywords: observação participante, heteroglossia, ahistoricidade, autoridade, textualidade
Dúvidas: Procurar saber do frontispício do Laufalt e do texto do Michel de Certeau como sugerido na nota de rodapé pelo autor.

Para tanto, o autor estabelece uma cronologia a partir da qual no começo do Séc. XIX, o etnógrafo não gozava do status de melhor intérprete da vida nativa, concorrendo ainda com o relato dos viajantes, especialmente, os missionários e funcionários públicos dos impérios. É importante esse ressalte, porque para o caso brasileiro quando se trata de estudar as representações dos indígenas pela coroa portuguesa; as principais fontes são justamente de missionários como, Padre Antônio Vieira, Padre Anchieta, Manoel da Nóbrega, bem como dos viajantes, neste caso, o próprio Pedro Álvares Cabral e os governantes que aqui a coroa colocou.
A problematização para o caso norte-americano da construção da etnografia se deu a partir dos trabalhos Frank Hamilton Cushing e Margareth Mead. O autor ressalta uma forma particular de autoridade criada (a) uma autoridade cientificamente validada e caudatária de uma experiência única e individual. Apontando, por conseguinte, uma critica de Malinowski com relação a um funcionário do império britânico e sua falta de pericia cientifica para o caso dos Trobriandeses que o mesmo estudava. Disto Clifford conclui que, a partir da metade do sec. XX, o sucesso do trabalho de campo surgiu como uma nova fusão de uma teoria geral e a pesquisa empírica, ou da analise cultural a partir da descrição etnográfica.

Ressalto aqui a constituição de um quadro da formação da autoridade etnográfica a partir do estabelecimento da experiência de campo. Comparam-se trabalhos sobre os trobiendeses a partir de missionários e a própria regra geral que se estabelecerá, segundo o autor, a partir do trabalho de Margareth Mead, Malinowski e Radcliff-Brown. O autor destaca o argumento destes etnógrafos como produção do conhecimento por partes dos seus precursores como sendo sem base de hipóteses cientificas e falta de neutralidade.
Entre os relatos dos viajantes, o autor menciona a forma de pesquisa colocada na Inglaterra no começo do Séc. XX e o papel de Tylor na proposição de maiores critérios na coleta de dados para o estabelecimento da analise antropológica. Contudo, somente com Malinowski que a pesquisa de campo foi realmente estabelecida, sendo o próprio antropólogo que irá a campo coletar os dados. Assim, Clifford menciona a distancia entre os antropólogos como formuladores de grandes teorias da humanidade e o trabalho de descrição-tradução efetuado pela etnografia. “Malinowski gives us the image of the ‘new anthropologist’ – squatting by the campfire; looking, listening, and questioning; recording and interpreting Trobiand life.” (Clifford, 1983, p.28)

Algumas técnicas no texto de Malinowski são analisadas por Clifford como apontadas por Stocking, tais como: utilização de formas narrativas para a construção do texto, voz ativa no ‘presente etnográfico’, dramatizações da participação do autor na vida dos Trobriandeses, técnicas que colocam a experiência do autor como a experiência do leitor como se ele estivesse lá. Estes seriam os critérios de excelência na pesquisa de campo etnográfico, a produção de uma narrativa simultaneamente sobre a vida de um povo e o do trabalho de campo como critério científico que dá validade a observação participante. De modo que se anuncia uma poderosa metodologia cientifica bem como um novo gênero literário a própria etnografia baseada na observação participante.

São seis os pontos ressaltados pelo autor que caracterizam diretamente este estilo: Primeiro o convívio com os nativos, segundo a questão do conhecimento da língua nativa, com uma provocação de Lowie para o argumento de Mead, quando afirma que traduzir o romance de Proust não equivale a ter conhecimento sobre os franceses. Terceiro, no poder da observação, os fatos etnográficos como objetivos passiveis de serem gravados, tais como comportamentos, rituais. Concluindo que depois de Malinowski há predileção à interpretação dos dados feita pelo etnógrafo em detrimento a observação interessada das autoridades. Quarto a capacidade de generalização oferecida pelo conhecimento teórico; para o caso de Rivers o método genealógico; e, no caso de Radcliffe-Brown, o conhecimento das estruturas sociais e que possibilitaria a comparação. Em quinto, o procedimento metodológico funcionalista de partes assumindo a função do todo, como no caso de se estudar um ritual especifico na explicação das instituições econômicas – Kula.
Sexto, o todo representado de maneira sincrônica. Descartando a leitura de grandes processos no tempo que a metodologia inviabilizaria. Malinowski e Radcliff-Brown reprovam a abordagem diacrônica fazendo criticas ao método difusionista da ‘historia conjectural’.

Keywords: ‘presente etnográfico’, observação participante, funcionalismo, metonímia, sincronia, diacronia.
Dica: Observar a constituição de uma metodologia de pesquisa e a crítica ao estabelecimento do critério ‘cientifico’ como possibilidade de verdade única. Meta-etnografia e crítica aos pressupostos da disciplina.

Depois de situar estes seis pontos caracterizando a metodologia da observação participante, o autor passa a analisar o trabalho de Evans Pritchard como uma espécie de milagre devido as circunstancias em que foi feito. E a critica de Evans-Pritchard ao estilo casual e fortuito da coleta de dados de Malinowski no sentido de que os dados só são conectados a teoria e que isto diferiria seu trabalho, com relação ao autor, na medida em que toma este fato conscientemente.
Segundo Clifford, a observação participante é paradoxal, uma relação entre o dentro e o fora, no sentido em que é reformulada em termos hermenêuticos como uma dialética de experiência e da interpretação. De uma tradição que remonta de Wilhelm Dilthey a Max Weber e na antropologia a Clifford Geertz da análise do símbolo ao significado. Aponta que o trabalho de tradução e de interpretação dos dados foi relegado para segundo plano na relação entre a experiência e a interpretação, no caso da observação participante e a consideração da autoridade etnográfica. Pois o trabalho de campo é centrado na experiência e aponta que as condições de produção do texto é quase nunca revelada.

A separação da experiência e da interpretação é central no argumento de Clifford, pois nela residiria a construção da autoridade etnográfica. O autor precisa o conceito de experiência a partir da noção de verstehen de Wilhelm Dilthey e chama atenção para diferença deste no caso da antropologia. Outra opção para o entendimento da experiência como procedimento metodológico é a proposta de conhecimento conjectural proposta por Carlo Ginzburg.
A grande contradição nesse conceito de experiência, no caso da antropologia, segundo Clifford, seria colocada pelo fato de que é esta experiência que garante a autoridade etnográfica: Segundo o autor: “Experience evoques a participatory presence, a sensitive contact with the world to be understood, a rapport with its people, a concreteness of perception. I also suggests a cumulative, deepening knowledge (“ her tem years’ experience of New Guinea’). The senses work together to authorize an ethnographer’s real but ineffable feel or flair for “his” or “her” people. It is worth nothing, however, that this “Word”, when conceived as an experiential creation, is subjective, not dialogical or subjective. The ethnographer accumulates personal knowledge of the Field (the possessive form my people has until recently been familiarity used in anthropological circles, but the phrase in effect signifies “my experience”) Clifford, 1983, p.37)

Keywords: experiência, interpretação, autoridade etnográfica, subjetividade
Dica: Observar a fundamentação de Dilthey com relação à experiência, o método oferecido por Carlo Ginzburg e a relação com a ambigüidade da palavra experiência.

A crítica a esta relação com a experiência se dá, primeiramente, a partir da antropologia interpretativista que parte da pergunta de como o objeto “cultural” é inventado e tratado como significativos além de remontar a metodologia ao caráter hermenêutico da interpretação das culturas como um texto a maneira da filologia. A idéia vem de Paul Ricouer (1973) e depois sistematizada em antropologia por Geertz (1973). Textualização é o pré-requisito para a interpretação ao que Dilthey chama de “expressões fixadas”
O autor passa para uma definição clássica de discurso segundo Beneviste e aponta a critica de Ricoeur que afirma que a interpretação já esta fora do campo comunicativo e pretende uma relação desse discurso com uma realidade exterior. Por isso, quando um discurso se torna um texto ele fica autônomo fazendo com que a interpretação deixe de ser uma interlocução. Não depende das intenções do autor ou da presença do falante. Assim as implicações para a etnografia são ressaltadas como a experiência virando narrativa, significados ocorridos, os dados viram textos e não estão inseridos nos contextos discursivos.

Ainda segundo o autor, a tradução da experiência de pesquisa em corpo textual separado das ocasiões discursivas tem importantes conseqüências para a autoridade etnográfica. Assim o contexto discursivo é esvaziado pelo etnógrafo a partir de uma generalização que assume o ‘ponto de vista nativo’ como no caso: ‘dos nuer’, ‘dos dogon’… A ênfase na construção coerente da narrativa e o processo de produção dessas são decantados para o texto final, assim, diário de campo, a conversa com os informantes, as contradições são suprimidas a fim de dar ao texto a forma de um todo coerente.
Keyboard: texto, cultura, autoridade, dados de campo, produção final, Geertz
Aparece, por fim, a critica ao deslocamento efetuado pela antropologia interpretativa com relação à autoridade etnográfica precedente a partir da reflexão sobre a construção do texto. No entanto, este esgotamento não basta por si só e é criticado a partir de uma politização das interpretações como posição colocada por Talal Asad (1973). A partir de Bakthin toma-se a linguagem deixando de ser uma pratica neutra e sim com acentos e realces.

Apresenta-se o modelo discursivo de escrita etnográfica, que leva em conta o contexto da fala e as situações de interlocução como parte da pesquisa. Com a afirmação de Fravet-Saada (1977) de que o evento de interlocução sempre coloca o etnógrafo em uma posição no campo de relações intersubjetivas. O autor cita também as propostas de Bwyer (1977) e Capranzano (1980) sobre a etnografia como um processo de dialogo entre os interlocutores que ativamente negociam uma visão de mundo sobre a realidade. A aproximação do discurso etnográfico do realismo.

Keywords – politização das interpretações, ‘encontro etnográfico’, texto, discurso,

Duvidas: A etnografia segundo Talal Asad, a proposta do dialogismo, o efeito discursivo e uma nova etnografia.

O autor chama atenção para o fato de que dizer que a etnografia é composta de discursos por diferentes componentes ialogicamente relatados não é o mesmo que dizer que esta forma texto poderia ser um diálogo literal. A proposta de um terceiro participante por Capranzano, um terceiro fictício como mediador do encontro entre dois indivíduos. E Rosaldo colocando a questão do interstício de seu trabalho sobre a verdadeira autoria das notas de campo.

James Clifford

o. . . Alone together
James Clifford

Professor, History of Consciousness Department,
University of California, Santa Cruz
Santa Cruz, CA 95064. USA
jcliff@ucsc.edu

1969-77 Ph.D. Harvard University, History
1967-68 M.A. Stanford University
1965-66 London School of Economics and Political Science
1963-67 A.B. Haverford College
(fonte: http://people.ucsc.edu/~jcliff/contents.html)

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                                             Lila Abu-Lughod

Nossa! Depois de pronto, olhar e ver a resenha de 4 livros e ainda fazer uma proposta de uma nova Antropologia parece, em um primeiro momento, algo fácil quando vista prontinha aqui na internet. Muito pelo contrário, não teve nada de fácil como comentado na última aula. Entretanto, pelo menos como exercício valeu a pena. Faltam sempre os ajustes.

 Esteban Krotz                                                   David Graeber

Algumas partes já estão na Resenha de Lila Abu-Lughod e aqui aparecem já em um outro texto. Tudo sem revisão, por que estes últimos escritos (umas 40 pág de Word) são de um período de tempo de menos de uma semana. São muitas leituras, por conseguinte, as escritas se tornam um verdadeiro parto. No entanto, desejo-me boa sorte no ritmo que tenho levado. Revisões ortográficas e gramaticais no meio de tantas idéias serão feitas algum dia quando da reeleitura dos textos que não aguento nem olhar mais!

                                                Walter Mignolo

 

 

UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ANTROPOLOGIA SOCIAL

 

 

RESENHA CRÍTICA E PROPOSITIVA: Outras antropologias são possíveis.

 

                  “A tempestade na/da Antropológi(c)a, Processing…”

Atividade como requisito para o cumprimento de créditos na Disciplina Epistemologia da Antropologia (Teoria Antropológica a partir de 1980) no Programa de Pós – Graduação em Antropologia Social do Dan/UnB ministrada pelo Profº  Drº Paul E. Little.
 

 

 

João Paulo Aprígio Moreira

 

 

 

A TEMPESTADE NA/DA ANTROPOLÓGI(C)A, “PROCESSING”…

                                                                                 “A antropologia ainda não morre”                    

Manuela Carneiro da Cunha

A antropologia tem conseguido dar muitas explicações, mas todas elas retrospectivas. Nas últimas décadas, passou muito tempo explicando até seu próprio passado. O futuro da disciplina, esse, ninguém sabe. Ela foi declarada em estado grave há umas duas décadas, mas até agora não vi atestado de óbito.” (Folha de São Paulo. São Paulo, domingo, 17 de dezembro de 2006 ).

 

A primeira resenha que aqui se segue, “Writting against culture” de Lila Abu-Lughod, com um nome já bastante sugestivo, indica com muita acuidade, uma perspectiva para o problema que vamos nos dedicar nos próximos quatro textos, qual seja: A “crise?” da Antropologia na pós – modernidade. Apresentaremos uma resenha de cada um dos autores focando, principalmente, no de Walter Mignolo e o de Lila Abu-Lughod. Tenciona-se problematizá-los a partir de uma determinada perspectiva que é diretamente correspondente à proposta por nós esboçada, resultado da formulação de uma crítica que fosse propositiva.

Todavia, acredito que, devido à extensão do trabalho, este não deve ser tratado sob o aspecto de uma resenha apenas, pois trata-se, antes de tudo, de fichamentos de textos que foram primeiramente traduzidos, preconizando desta forma, uma analítica densa. A seguir tem-se a tentativa de um dialogo intertextual que toma como eixo a crise epistemológica na(da) antropológi(c)a, especialmente a partir da Déc. de 80, que teve como conseqüência, não só nesta disciplina mas em outras também, a fragmentação. È possível perceber uma discussão sobre a prática etnográfica de maneira problematizada em perspectiva “conflituosa” no próprio discurso como, por exemplo, as críticas dos Cultural Studies ( Cult Studies como destaca Sahlins:2001 o termo tratado por Tom Frank), versando sobre a questão de identidade ou o que eu chamaria de supressão epistemológica, narrada no texto de Mignolo na forma de oposição entre paradigma decolonial e o paradigma do noveloso. Como se vê, poderíamos falar de uma crise de representação, que vai desde um nível teórico a feitura do próprio texto como os problemas colocados por Abu-Lughod e seu debate da significância da teoria feminista para a teoria antropológica quando problematiza o tipo de disposição das forças na relação “eu” e “outro” automaticamente ajustada em nível epistemológico através do conceito de cultura na Antropologia de maneira hierarquizadora ao “marcar diferenças”, chegando ao final a sugerir estratégias textuais.

Por outro lado, a perspectiva disciplinar é retomada por Graeber ao propor uma Teoria Antropológica anarquista, ou seja, que passe a tratar de problemas relevantes ao movimento como a questão da autoridade. Simultaneamente isto é feito no caminho inverso pela formulação de respostas antropológicas/históricas que fundamentem o Anarquismo a partir da Teoria. Questões teóricas da antropologia como os modos de vida de outras sociedades, a construção do estado-nação, noções de poder, cosmologias, capitalismo, teorizações são colocadas como “respostas” aos problemas das relações sociais a partir de uma lógica anarquista. Fechando com a necessidade da utopia de Krotz em “La Otredad Cultural entre utopia y ciência” como acréscimo na prática antropológica, esvaziada desta na busca de uma objetividade científica (positivista, evolucionista) com a qual a antropologia em seus tempos de fragmentação estabeleceu uma relação crítica, para não dizer desconfiada. Com exceção de Graeber, todos os outros dividem uma crítica com frente anti-colonialista, cada um falando da “mundialização”* de um forma própria e da necessidade de posição política na prática antropológica. Deve-se considerar o caráter ensaísta de alguns dos textos, que nesses tempos se tornam densos e um tanto quanto confusos e que embora tratem de problemas semelhantes, a disparidade dos locais de “fala” levam os argumentos à uma variação de matizes quase que babilônicos (torre de babel), o que nos força a ponderar a dificuldade de um diagnóstico preciso que esperamos, até por nossa formação – História -, o tempo como mediador consiga “aclarar”, não totalmente, mas pelo menos ajudar no entendimento. Toda questão no calor do momento tende à se complexificar. Talvez, seja essa a grande dificuldade quando se fala de política etnográfica, e na política tudo é mais confuso quando não se crê em nada, daí a necessidade de “utopias” como chama a atenção Krotz ou; se crê em muitas coisas diferentes com necessidade de consenso. A antropologia encarnou todos esses problemas como nenhuma outra disciplina. Assim, conciliar o “eu” e o “outro”, talvez seja a questão mais relevante em tempos de “paz” e de “guerra”, como o que vivemos.

Por último, tento um exercício mais livre de proposição de uma nova antropologia como possibilidade, tratada a partir da vocação meta-reflexiva (Cardoso de Oliveira, 1988.) da disciplina no que diz respeito a uma etnografia do conhecimento. Em outras palavras, como o método etnográfico pode ser proveitoso para fornecer uma disposição específica para com a própria História da Antropologia sendo ela mesma iluminada criticamente pela prática etnográfica utilizada como auxilio na problemática da História da Ciência.

Com isto podemos tomar a fragmentação da própria disciplina Antropologia como um problema-caso. Essas questões  são divididas dentro de várias outras disciplinas, como no caso da Epistemologia das ciências humanas (no sentido interno), sociologia do conhecimento, história da ciência ( no sentido interno e externo), e tantas outras, que neste caso particular, se propõem a pensar as mudanças teóricas de uma disciplina específica, que no nosso caso é a Antropologia. Faremos uma breve apresentação dos autores por ordem de exposição.

O primeiro texto com que vamos trabalhar, e desde logo já chamo atenção para nossa proposta inicial esboçada anteriormente, é ” Writting Against Culture” publicado em “Recapturing Anthropology: Working in the Present, ed. Richard Fox. Santa Fe, NM: School of American Research” de Lila Abu-Lughod.

Lila Abu-Lughod é Professora na Columbia University. Seu trabalho publicado em 1986: “Veiled Sentiments: Honor and Poetry in a Bedouin Society. Berkeley: University of California Press.” conferiu-lhe o título de PhD. em Antropologia pela Harvard University, entrando também para a lista dos 21 melhores livros dos estudos conhecidos como “Middle East Studies”, cuja figura de peso é Edward Said com seu clássico Orientalism. Seu campo foi em uma comunidade Beduína no Egito, onde trabalhou com os temas emoção, poesia e gênero sob uma perspectiva de crítica ao conceito de cultura. Seus interesses maiores são políticas feministas no mundo Árabe e pós-colonialismo.

O segundo autor a ser tratado é Walter Mignolo é professor de Literatura na Duke University em Durham nos Estados Unidos e tem estudos focados na área de semiótica, de analise do discurso e teoria literária. Seus livros estão dentro de uma tradição de crítica ao que se pode entender como caminhos para um pós-ocidentalismo mediado pela contribuição de um paradigma da coexistência, fruto da experiência dos povos que foram colonizados, sobre a perspectiva do América Latina.

Já David Graeber é um “anarquista, antropólogo e professor associado da Universidade de Yale. Esta universidade, no entanto, se negou a recontratá-lo após o término de seu contrato em junho de 2007, assunto em torno do qual se apresentam controvérsias e cartas de apoio ao professor e de repúdio à decisão da diretoria da universidade. Autor de Fragments of an Anarchist Anthropology e Towards and Anthropological Theory of Value: The False Coin of our Own Dreams, Graeber realizou extensos trabalhos antropológicos em Madagascar, escrevendo sua tese de doutoramento (The Disastrous Ordeal of 1987: Memory and Violence in Rural Madagascar), a respeito da reprodução das divisões sociais entre descendentes de nobres e escravos.”

E por último Esteban Krotz, antropólogo da Universidade Autônoma de Yucatan, cujo os texto  “Crecimiento y fragmentación de la antropología” e “El perfil de una nueva pregunta antropológica” são reflexivos sobre as origens , o desenvolvimento e a reorientação da antropologia na sua relação com a diferença cultural.

Os dois primeiros tomaremos com mais por menor na necessidade de situar a problemático em que os demais também estão em diálogo o que nos interessa é mostrar as diversas propostas presentes nos textos e acrescentar alguns comentários que nos possibilite pensar uma outra antropologia possível. Primeiramente comentemos o texto de Abu-Lughod.

Problematizando o conceito de cultura em sua essencialidade e naturalidade como ocorrido com o conceito de raça anteriormente, Abu-Lughod chama à atenção para os dilemas impostos à prática etnográfica recentemente, mas a partir de uma reflexão interna na Teoria Antropológica. Em um primeiro momento, a autora argumenta sobre a relação de ingratidão da Antropologia com a escola feminista. Falando de Writting Culture de Clifford, a autora utiliza uma estratégia textual para a resolução de um problema que a priori é teórico. A saída para um problema conceitual (cultura) a partir de uma questão de representação refletida na escrita dos textos antropológicos. Conhecido sob o rotulo de crítica da autoridade etnográfica, a autora chama atenção para uma perspectiva específica: fazendo uma crítica do conceito de cultura, e as relações hierárquicas que estão implícitas no trato antropológico do mesmo, questionando o poder. O ponto de crítica é a convergência, e isso no texto aparece sob a forma de uma querela teórica em relação à contribuição do feminismo para antropologia. Fala-se das críticas feministas à representação, como ocorrida em seus grupos, e das críticas pós-colonialistas da relação ocidente e não-ocidente, como tratada pelos problemas dos Halfies. O que é bom salientar é o local donde saem suas críticas, como já mencionado anteriormente seu campo foi no Oriente Médio, palestina, a autora é formada nos Estados Unidos, e essa relação conflituosa é vivida cotidianamente por lá, um exemplo o fato extremo resultado com o Atentado de 7 de setembro às torres gêmeas. Não que coloquemos os fatores históricos como determinantes dos problemas teóricos, mas o que se pode perceber é que esta relação conflituosa (velada) do cotidiano norte-americano refletiu diretamente nos problemas teóricos da Antropologia por lá feita, o que não seria nenhuma novidade.

Entretanto, o grande marco defendido pela autora no texto é além de uma crítica ao conceito de cultura ou a autoridade etnográfica – e outras até então já tinha sido feitas – considerar a “virada histórica”, para os problemas de falta de historicidade nas mudanças culturais o que a autora trabalha sobre as noções de “coherence, timelessness, and discreteness” (Abu-Lughod, p. 147: 1991) -, dar ênfase na questão do poder, das relações assimétricas contidas na oposição do olhar antropológico presentes na dicotomia “Eu” e o “Outro”. Não obstante, a partir de noções foucaultianas, mais do que uma crítica a autoridade etnográfica, a autora avança refletindo sobre inovações na escrita etnográfica que tentam implodir esta noção de oposição assimétrica contida no conceito de “cultura”.  Desta maneira é que coloca as possibilidades oferecidas em trabalhar com as noções de prática e discurso, as conexões históricas da relação antropólogo e grupo estudado, não sob uma perspectiva existencial, mas sim das relações históricas entre os dois grupos relacionados no “experimental moment” ( Abu – Lughod apud Marcus and Fischer 1986) e, com uma maior ênfase, na etnografia do particular, que diz respeito à uma estratégia de pesquisa que visa escrever experiências individuais no tempo e no espaço a fim de captar as contradições internas presentes na perspectiva “micro”, que fazem confluência com o padrões que são tido como únicos na perspectiva “macro”.

Da contribuição do feminismo à Antropologia, mesmo a despeito da ingratidão para como a mesmo por parte da Antropologia, a autora passa para uma crítica do humanismo, mostrando que a própria reflexão da autoridade etnográfica pode se configurar como uma tática, sendo a própria “crise” um resultado e uma resposta para a Antropologia.

Com relação às respostas vindas por perspectiva teórica, substantiva, ou textual; a primeira referente aos conceitos de discurso e prática, a outra abordagem substantiva dizendo respeito às conexões históricas, e a última a textual, dessas três abordagens exploradas pela autora contra o conceito de cultura em sua reificação, a que sustenta toda sua argumentação, com um diálogo com a Teoria Antropológica no que diz respeito à contribuição histórica do feminismo, é a saída Textual.

A etnografia do particular como estratégia textual dispõe um modo de escrita e observação etnográfica que, ao mesmo tempo em que combate o conceito de cultura, tem a vantagem de posicionar politicamente o pesquisador redimindo-o das criticas postuladas para o relativismo de um lado, ou para a neutralidade positivista do outro, transformando um problema de agenda política em um problema teórico, que por conseguinte, cria uma disposição metodológica para a pesquisa antropológica.

Teoria etnográfica enriquecida por técnicas de observação novas, e estratégias de escritas novas respondendo ao problema da autoridade etnográfica colocado por Clifford. Ainda assim, essas mudanças são frutos além de respostas à problemas teóricos da disciplina como bem tratado argumentivamente pela autora e sim, também, resultados de uma conjuntura histórica específica que não foi recuperada, sendo este o ponto fraco do texto por nos deixar sem muitas explicações. Se observamos, todas as críticas ao conceito de cultura nas relações ocidente e oriente envolvem questões políticas que têm que ser contextualmente localizadas.

 E para não ficarmos somente na crítica histórica encerremos com uma citação de Marshall Sahlins à guisa de ilustração:

                                                                                             “Heráclito x Heródoto

 Um dos argumentos correntes contra a coerência das culturas e a possibilidade de se realizar qualquer tipo de etnografia sistemática é que, como um certo rio filosófico de renome, as culturas estão sempre mudando. O fluxo é de tal natureza que jamais se pode mergulhar duas vezes na mesma cultura. E, todavia, a não ser que alguma identidade e consistência sejam simbolicamente impostas às práticas sociais, como também aos rios, não apenas pelos antropólogos mas também pelas pessoas em geral, a inteligibilidade, ou mesmo a sanidade, para não falar na sociedade, seriam impossíveis. Pois, parafraseando John Barth, a realidade é um lugar para se visitar (filosoficamente), mas ninguém nunca morou lá.” (Sahlins, p.19:2003)

 

Mignolo com uma crítica também à epistemologia ocidental ao invés de tratar questões de método e até por seu universo ser o da crítica literário nos chama à atenção para uma versão latino-americana do problema no lugar de uma da questão oriente – ocidente como trata Abu-Lughod. Porém, é interessante observar que os dois falam do mesmo local, ambos de formação em Universidade Norte-americanas e de lá escrevem seus textos.

Os livros de Mignolo tratam de questões dos Estudos Pós-coloniais. Este tema é uma reatulização a partir da experiência da globalização, já que no pensamento social latino americano sempre esteve presente uma narrativa à contra apelo da ocidentalização. O que se tem de diferente, portanto,  é a retomada de um debate a partir de uma experiência histórica especifica. Os processos de independência dos países latino-americanos e a construção dos estados – nações na América ainda sobre forças imperialistas estão dentro de outro processo histórico que não o de onde surgiram os primeiros debates pós-coloniais de tintas africana e asiática. O caso Indiano, ou dos países africanos são muito mais recentes do que o ocorrido na América Latina que é datado a partir do Sec. XIX. Isto configura uma especificidade que deve ser levada em conta problematicamente para o caso Latino Americano neste debate.  Os projetos de descolonização e utopistas existem em toda a história da América, ou seja, estamos tratando de um projeto específico já adiantando os que reclamam da falta de uma agenda política.

O pós-colonialismo Disputa política nas academias norte-americanas a partir do rotulo de “cultural studies” divide o saber a partir de uma geografização do conhecimento tendo como critério classificatório regiões identificadas culturalmente, em detrimento a problemas de fronteiras disciplinares. È neste contexto que conceitos como “fronteira” e “território” passam a caracterizar a política, produzidos num contexto de constantes fluxos migratório e que comungam uma experiência globalizante, acompanhada explicitamente pelos movimentos migratórios de ex-colônias para os países do centro, só que agora em um sentido diferente do que em outras épocas. Este fluxo nos Estados-Unidos, por exemplo, se reflete diariamente nas ruas e não só, mas também nos departamentos das universidades onde aparecem intelectuais como este materializando teoricamente o conflito, mas creio não de uma perspectiva reflexiva, mas muito mais “vivida”, o que dá o teor de “política” e ao mesmo tempo de dificuldade nas ciências sociais. Algo bastante experimentado em sua prática de pesquisa que é dar versão aos fatos cotidianamente vividos.

A noção colocada em questão por Mignolo é a de um estado multicultural  em detrimento a um estado pluricultural que não consideraria apenas uma cosmologia válida. Situa-se aí a critica ao multiculturalismo, que engendra o projeto intelectual do qual Mignolo propõe. O caso da “Pluri-versidade” de Amawtay Wasi é expressivo neste ponto através de ataque às instituições universitárias que não tem os povos indígenas estudando assuntos que sejam de seu próprio interesse. O que não coloca em cheque à tradição ocidental e sim: “reproduzir esta prática significaria atuar segundo a lógica ocidental trocando apenas os conteúdos e não os termos em que se produz o conhecimento,”(Mignolo, 2007 ). Esta troca significa para Mignolo um reordenamento na produção do conhecimento o que ele especifica pela expressão uma mudança na “geografia da razão”.

Interculturalidade não faz par à multiculturalidade que segundo Mignolo significa que os princípios hegemônicos do conhecimento, a educação, as noções de Estado e governo, a economia política e a moralidade, entre outras questões são controladas pelo Estado, e que a partir deste controle, somente assim que as pessoas têm a “liberdade” de seguir adiante com sua “cultura” sempre que não põem em risco os “princípios epistêmicos” que sustentam a política, a economia, e a ética estatal (Mignolo, 2007 ). Não obstante, a interculturalidade segundo Mignolo dá conta de cosmologias diferentes: a ocidental e a indígena, por exemplo. E em sentido amplo como o mesmo Mignolo, interculturalidade se refere aos povos indígenas que reclama seus “direitos epistêmicos”, que não é o mesmo que “direitos culturais” (Mignolo, 2007 ). Fica claro pensando a partir destes conceitos a posição hierarquizada de certos grupos que tem concedidos à sua existência limitadamente seus direitos, e um problema ainda fica mais grave se pensarmos em países em que a maioria da população não responde as categorias ocidentais. 

Assim, é deste mesmo embate que surge as teorias de aculturação como amplamente solfejadas na política indigenista do Brasil até a Déc. de 70. Levantamos uma objeção acerca da participação destes indivíduos mesmo que de maneira mitigada na construção destes próprios Estados. Estes não são os termos colocados por Todorov, os casos do sincretismo religioso das religiões afro-brasileiras? Se nestes casos temos exemplos históricos de resistência “cultural”, não haveria aí uma tática de resistência política especifica e, portanto, começa daí a participação destes próprios na construção do estado-nação, entendendo-o como comunidade imaginada conforme nos mostrou Benedict Anderson?

Segundo Mignolo a noção de interculturalidade foi introduzida em princípios dos anos 90 por intelectuais e lideres indígena e estava ligada a projetos de educação bilíngüe na (CONAIE) – Confederação de nacionalidades Indígenas do Equador -. A noção de fronteira tomada como substituição do sentido ideológico implícito no termo território como colocado por Simon Bolívar e Thomas Jefferson é um conceito fundamental para Walter Mignolo. Principalmente, no que se refere a uma nova categoria para se pensar o lugar da “América” através de uma postura crítica em um mundo globalizado. Esta é uma das possibilidades aventadas por Mignolo em seu projeto intelectual de crítica epistemológica através de noções como a de interculturalidade. Trata-se de uma proposta fruto de práticas institucionais específicas como exemplificadas no texto: Associação Caribenha de Filosofia, (CONAIE), Amawtay Wasi (Universidade Intercultural das Nações e Povos Indígenas), o Levantamento Zapatista de Chiapas “Los Caracoles”, Fórum Social Mundial, Fórum Social da América, entre outros.

Mignolo também exemplifica os usos da expressão América Latina nas políticas de identidade, tanto usado por estado-unidenses, intelectuais, sul-americanos, caribenhos, europeus, e como o termo aparece em diferentes usos de acordo com o contexto político a que está submetido. A proposta do paradigma da coexistência substanciado a partir da noção de interculturalidade como contribuição da experiência sofrida na “ferida colonial” como crítica à hegemonia ocidental.

A proposta de Walter Mignolo tem por foco principal A ênfase na discussão decolonial a partir do pressuposto da unidade de um projeto imperial ou decolonial que não pressupõe “diferenças” subjetivas, mas que leve em consideração, estritamente a questão da relação opressão/exploração. Aí está uma diferença básica em seu eixo de reflexão com relação às “políticas de identidade”. Estas mesmas que em um primeiro momento na confluência da “bagunça pós-moderna”, aparece acusada de profundo alheamento político tendo em vista o ceticismo “pós – moderno”. Assim a proposta decolonial coloca-se como uma alternativa política, levando-nos a refletir sobre a questão anterior.

Alguns apontamentos são passíveis de uma reflexão mais acurada em termo críticos: Quando a proposta de Walter Mignolo começa a debater a partir de “políticas de identidades” tomando como centro o que o autor chama de “ferida colonial”, sob o encalço de uma geopolítica também corporal está a selecionar um pressuposto que fundamenta o agir e o pensamento dos grupos envolvidos neste processo. Vale ressaltar, então, se não está sendo colocado um “falso” problema, como a questão: ler ou não ler Kant e Heidegger em detrimento a um pensamento autêntico? E aqui se faz a pergunta: o que tomar como autentico? Tal disposição teórica nos leva a indagar sob até que ponto uma radicalização de postura – esta que se estende até uma crítica à tradição do Pensamento Social Latino Americano, que segundo o autor remete diretamente ao crioulismo, e que, efetivamente, não dá conta de todas as identidades reinvidicadas atualmente. A situação é mais complicada pela aparição de um maior espaço para grupos atuarem politicamente, tendo em vista os constantes encontros, as facilidades dos meio técnicos de comunicação, entre outros, que levam a aparição de um maior número de interesses em jogo.

Temos assim diferentes propostas políticas reivindicadas por diferentes grupos no tempo histórico. Atualmente, a de Mignolo é fruto de práticas institucionais localizadas, e a proposta que coloco aqui é o levantamento histórico como perspectiva crítica dos diversos grupos e interesses envolvidos nos debates colocados, não com o intuito de um apoliticismo gratuito ou interessado como alguns poderiam supor, mas sim na tentativa de compreensão mais profunda, que não toma a reflexão a partir do caráter de “manifesto” como colocada por Mignolo. A partir daí pode-se fazer com auxilio da História uma Antropologia mais compreensiva, já que estamos diante de reinvidicações locais em contextos globais, de diferentes matizes culturais. A proposta fica assim então mais reflexiva do que prática, porém não assumindo uma postura desmerecedora da prática, mas levando em consideração a teoria como fruto de reflexão juntamente com a prática que não necessariamente implica “militância”. A questão que  no texto de Krotz é tratada como utopia reflete muito bem este problema acerca da necessidade de utopia na prática cientifica, que no meu entender não é nada mais do que necessidade de prática militante acreditando em um fim, e por isso mesmo sempre revolucionária. 

Parodiando uma conhecida música brasileira “cavalo manco”, assim é a antropologia que tomou a prática militante como projeto dominante. No meu entender, a disciplina não deve se fazer apenas utopicamente na prática militante, pois por mais revolucionaria que seja esta maneira, tal postura acaba por nos levar a perder os detalhes da estrada, de onde falamos? Porém, não se deve polarizar a situação para o lado contrário também, pois, ao mesmo tempo, a antropologia não deve nunca olhar para trás de forma exagerada (história), sob peso de se tornar meio de políticas conservadoras.  E, para completar, não deve permanecer parada atenta somente aos detalhes.  À antropologia cumpre refletir e agir considerando sempre o movimento em que está submetida, e é neste momento que a etnografia do conhecimento com sua vocação meta-reflexiva e a história da disciplina se tornam excelentes instrumentos para uma auto-reflexão. Com Mariza Peirano: “Onde está a Antropologia?” Ela está nesse exato momento respondendo: “Que barulho é esse o dos pós-modernos?” – citando Wilson Trajano – na antropologia.

 

 BIBLIOGRAFIA

 

Abu-Lughod, L. (1991). “Writing against culture”. In: Recapturing anthropology: working in the present, . Santa Fe: Richard Fox.

Anderson, B. (2005). Comunidades Imaginadas – Reflexões Sobre a Origem e a Expansão do Nacionalismo . Lisboa: Edições 70.

Graeber, D. (2004). “Blowing up walls” e “Tenets of a non-existent science”. Fragments of an anarchist anthropology. Chicago: Prickly Paradigm Press.

Krotz, E. (1994). La Otredad Cultural Entre utopía y Ciencia: Um estudio sobre el origen, el desarollo y la reorientacion de la antropologia. México: Fondo de Cultura Econômica.

Mignolo, W. (2007). La Idea De América Latin: ” La herida colonial y la opcion decolonial”. Barcelona: Gedisa Editorial.

Oliveira, R. C. (1982). Sobre o Pensamento Antropológico. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro.

Peirano, M. (1997). “Onde está a antropologia?”. A teoria vivida e outros ensaios de antropologia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar .

Sahlins, M. (2003). Esperando Foucault, ainda. São Paulo: Cosac e Naify.

Todorov, T. (1982). A Conquista da América: A Questão do Outro. São Paulo: Martins Fontes.

 

 


 

  *Aqui chamo atenção para o termo “mundialização”  no sentido da crítica de Abu-Lughod, Krotz e Mignolo, guardado suas respectivas diferenças, como o processo de globalização tomado conceitualmente apenas como a expansão da cultura ocidental ( Europa, Estados Unidos). Isto através de uma política imperialista em detrimento de uma categoria que seja útil para pensar o processo histórico recente do estreitamento de relações das ex-colonias a partir de fluxos migratórios e pelo avanço técnico cientifico que resulta no estreitamento das fronteiras que tem como corolário uma hierarquização  “norte” e “sul”, “leste” e “oeste”, “centro” e “periferia”.

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